SOBRE AS AMIZADES, POR: SÃO FRANCISCO DE SALES

     A obra "Introdução à vida devota" do santo e doutor da Igreja São Francisco de Sales é uma das maiores riquezas da espiritualidade cristã, e sem dúvida, é leitura indispensável para qualquer católico, é extremamente útil tanto àquelas almas iniciantes quanto as mais avançadas na vida espiritual, pois além de possuir conselhos muito práticos de exercícios de piedade, é uma fonte riquíssima de conteúdo para meditação.

   Neste artigo irei resumir temas que São Francisco aborda em sua obra referente às amizades, especialmente após nossa conversão. Este tema é de extrema importância àquelas pessoas recém convertidas que desejam as boas companhias e querem evitar as más.

Sobre as amizades

   O maior doutor e teólogo da Igreja, Santo Tomás de Aquino, descreve a amizade como aqueles que desejam e rejeitam as mesmas coisas e diz que “por natureza todo homem é amigo”, e ainda destaca que a amizade, como uma virtude social, é necessária para se viver agradavelmente em sociedade. Ela é importante e fundamental para o florescimento da sociedade e felicidade do homem que se relaciona com o outro.

   Vale destacar que a amizade sendo uma relação de duas pessoas com os mesmos interesses, ao nos convertermos à religião católica formamos um firme propósito de odiar e evitar o pecado (especialmente o pecado mortal) a todo custo, e como muitas vezes, as amizades de nossa vida passada estão embasadas em interesses pecaminosos, é natural que após nossa conversão essas amizades acabem.

   São Francisco de Sales nos alerta acerca das más amizades pois o mesmo descreve: "sendo a amizade totalmente fundada sobre a comunicação entre duas pessoas, sua existência é quase impossível sem que as boas e más qualidades de uma passem à outra e vice-versa". O santo neste tema fala também sobre as amizades superficiais e as fundadas sobre as virtudes frívolas, que o mesmo descreve como aquelas virtudes as habilidades e talentos vãos como a de se vestir bem, dançar bem, ser bom galanteador e etc. Diz São Francisco: "A amizade fundada sobre a comunicação dos prazeres sensuais é grosseira, indigna do nome de amizade; como também aquela que é fundada sobre virtudes frívolas e vãs, pois estas virtudes dependem dos sentidos. Ora, como tudo isso diz respeito aos sentidos, as amizades que daí derivam são chamadas sensuais, vãs e frívolas, e mereceriam ser chamadas de excitamentos, antes de amizades. São assim habitualmente as amizades das pessoas jovens, que se apegam aos bigodes, aos cabelos, às olhadelas furtivas, às vestes, à empáfia, à tagarelice. Amizades dignas de idade dos amantes, que ainda não possuem virtude alguma, e cujo juízo ainda não aflorou. Desta forma, são amizades passageiras, e derretem como neve ao sol".

   Sobre as amizades verdadeiras

   As boas amizades como o santo define são aquelas que possamos fazer "comércio de coisas virtuosas", que seja acima de tudo uma amizade fundada sobre a caridade, e quanto mais sublimes forem as virtudes tratadas nessas relações, mais perfeita será tua amizade. E nos diz São Francisco : "Não faças outros tipos de amizades, quero dizer; não as procures. Pois não devemos abandonar nem desprezar as amizades que a natureza e outros deveres te obrigam a manter, como teus pais, parentes, benfeitores, vizinhos e outros, Refiro-me às amizades que dependem de tua escolha".

   É citado neste capítulo inclusive o próprio Santo Tomás que dizia que: "a perfeita amizade não pode estender-se a muitas pessoas. A perfeição, portanto, não consiste em não ter amizades, mas em evitar as que não sejam boas, santas e sagradas".

   Por mais que tenhamos amizades virtuosas, ainda sim teremos que lidar com as imperfeições de nossos amigos, a amizade exige a comunicação e o entendimento, sim, devemos suportar mansamente o amigo com suas imperfeições mas sem reforçá-las e muito menos absorvê-las para nós. São Francisco aqui reforça que está tratando somente de imperfeições e não dos pecados da pessoa, pois se tratando disso, as coisas são mais claras, diz o santo: "Pois é amizade muito fraca ou má aquela que vê perecer o amigo sem socorrê-lo, que o deixa morrer de um furúnculo por falta de coragem para lancetá-lo. A verdadeira amizade não pode subsistir em meio ao pecado". 

   A caridade sendo a base de toda boa amizade, vai exigir dos amigos a ajuda mútua no crescimento das virtudes, algo fundamental para isso é a oração, pois toda virtude, por mais que seja natural, é concedida por Deus a nós, e como sabemos, Nosso Senhor reserva as graças a quem pede.

Alguns conselhos sobre as más amizades

   As más amizades são aquelas baseadas meramente em prazeres sensuais, no caso das amizades mundanas, a amizade é fundada sobre o pecado. Mas há também a amizade com pessoas de baixa virtude, desleixadas, descompromissadas com Deus que também não nos fazem crescer, e assim nos aconselha São Francisco: "Assim que deles perceberes os primeiros sinais, dá-lhes as costas, e com absoluta repulsa a essa coisa vã corre para a cruz do Salvador, e envolve teu coração na coroa de espinhos, para evitar que essas pequenas raposas dele se aproximem. Guarda-te bem de qualquer acordo com o inimigo, nunca digas: "Eu o ouvirei, mas não farei nada do que me disser".

   E se acaso nos envolvermos neste tipo de amizade: "apresenta-te diante da Divina majestade, toma conhecimento em Sua presença do tamanho de tua miséria, de tua fraqueza e de tua vaidade, e, de todo coração, abomina esses inícios de amores, repudia a vã promessa que fizeste, renuncia a todas as juras que recebeste. E com vontade absoluta, toma a decisão de nunca mais envolver-te em tais jogos e conversas de amor."

  Sobre aqueles que não puder afastar-te: "é preciso impedir qualquer conversa particular, todo encontro secreto, qualquer doçura no olhar, qualquer sorriso, e de forma geral quaisquer comunicações e pavios que possam acender este fogo fétido e fumegante. No máximo, se for inevitável falar ao cúmplice, que seja para anunciar através de uma declaração corajosa, curta e severa o divórcio eterno que se operou".

Referências Bibliográficas:

SÃO FRANCISCO DE SALES; Filotéia: Introdução à vida devota.1609.